segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Guria

Por um instante,
Parece que tudo silencia
Ao meu redor...

Por um instante,
Só de fechar os olhos
Pensando em você...

Por um instante.
Só de lembrar tuas fotos,
Sonhos e sorrisos.

Só de pensar que um dia
Eu te conheci e te toquei,
Como que através de um espelho...

Por um instante essa física
Que nos sufoca e dilacera
Aos poucos...

Essas curvas pelas quais
Cronos nos leva, assim,
Imprevisíveis...

Por um instante as marcas
De épocas e das tuas palavras.
Daqueles sonhos que a gente
Não esquece, nunca quis esquecer.

Por um instante essas palavras...
Que de repente dá vontade
De dizer que toda poesia
Que existe em mim
Sempre foi você.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Blindfolding

Caminhar para o precipício de olhos vendados. Que outra forma de voar com osso, carne e parafusos, sem risco e em palco improvisado? Teatro é sempre uma arte, parte forma, parte jogo, que guarda algo de mais verdadeiro a sobrepor encenações. Captar essa essência sem o vento batendo na cara é tarefa complexa, mais ainda quando se escreve do centro de um tornado. O colocar da venda, porém, é sempre voluntário; o tirar também. O que muda é descompasso entre tempo necessário para tanto e caminho das reflexões. Quando se está caindo, o tempo é sempre mais curto, mais imediato, impulsivo; quando você flutua, as ampulhetas se quedam, horizontalmente. Perceber a verdadeira intenção das pessoas é aceitar que elas são transitórias, como diria Heráclito, que se modificam por acordo e conveniência. É entender os limites que marcam permanência, ou que desafiam as mentiras e ilusões que contamos para nós mesmos. Porém a própria permanência implica em marcas, cada uma delas com seu cheiro específico, muitas vezes indeléveis. Aceitar tensão e consequências características destas duas forças antagônicas é escolha de poucos, bem como manter decisões até os últimos instantes. Talvez a questão toda seja a de perceber mudanças enquanto processo e realidade, não apenas vislumbre de desejo futuro ou passado.

Não muda o fato de que já vi algemas fechadas em uma mala, que a pessoa carregava por aí ao acaso ou com intenções bastante específicas. Porém, qual não foi minha surpresa ao saber, depois, que ela tinha esquecido das chaves?

sábado, 11 de dezembro de 2010

Air

"You’re going back to Brazil tomorrow, aren’t you?."

Encontrei-a meio que por acaso, falando sobre empresas, deveres, voo idêntico igualmente prestes a ser cancelado. Ela sabia inglês, estudante de direito, fotógrafa, intérprete, insana; ocaso. Acordei no dia seguinte, as roupas espalhadas, a bagagem ainda lá, ela dormindo nenhum milímetro além de meu corpo, a mente ainda repassando imagens difusas. Fome, encontro, desencontro, câmeras, zumbis, Jackson, killing people, bad jokes, Chii, donuts, smoothies. Chocolate cake. Em algum momento falávamos espanhol ou português quando óculos se batem num daqueles instantes que o tempo desacelera. Jogo, minha voz em seu ouvido, sua perna sobre a minha, o coração palpitante, as palavras quase mudas, os lábios próximos... Inevitar.
Asfixiantes, suspiro e confissão:

- You haven’t asked me the most important question…

- Err… Are you single?

- Not now.