domingo, 24 de julho de 2011

Ensaio
















As portas abertas de Outono trincaram no dia em que resolvera sair de casa; não de uma, nem de todas. O vendaval que iria desterrar as raízes de seus passos se insinuou de leve na beira da escada imaginária, daquelas que nos conduzem solícitas em suas falsas geometrias de pintores calados.

As vozes e cores se mesclavam aos ruídos externos, um tom cinza claro de folhas que caem em adeus e perspectiva. Custódia, o impacto singular de se perder aos poucos por esse mundo, de se ver esvair assim quase sem marcas - o peso de olhar para esses olhos mudos que te seduzem, azuis ou verdes assim-sem-cor, que tudo desbota enquanto você guarda esse silêncio-grito-esgaçado-flor de alguém que lhe espera a alguém que lhe traduz.

Inexorável, a apatia da incompreensão. Ela nos devora e consome e insone saliva seus hábitos de fome, seu hálito triste de folhas-secas-sem-amor que só sabem não-voltar, mas que já não sabem onde ir. Pois as gravidades Newtonianas do destino só se negam diante de tornados, eis que as folhas negras queimam em rituais e rodopios a salgar o diabo das recordações.

As recordações! Não fosse elas, você não sofreria processos - já nasceria assim eternamente criança com face de careta-grudada em janela de vidro, sempre a observar e idealizar as outras por entre o vislumbre das fábricas Wonka, corroendo e sonhando por dentro enquanto tudo ao seu redor começaria a flutuar...

“E tu não tens porque agradecer as minhas palavras quase-mudas ou a compreensão sistêmica calejada de nervos e amores. Basta me permitir o silêncio ou suspiro de te guardar e proteger assim, ao tempo de um abraço.”

“...mas não, o mundo se cala e ninguém sabe nem-deonde-nem-dequando-ou-porquê de você ir desvivendo assim aos poucos, de leve, carregando apenas o peso das cobranças sem nexo de todos que não te enxergam. “

“E não sabes tu que penso em ti quando tu te somes e divago assim ao meio da noite por qual destino e viagem perambulas? Que anseio por te ver mesmo que assim tão súbito e sabendo tão pouco e curioso pelos convites sutis dos teus olhos-quase-poentes?”

sábado, 9 de julho de 2011

Horizonte
















"To say what's in my heart
Sitting there by your side
Anyplace, anytime, anyhow."

O teu delinear
Me escapa em sutileza;
Os contornos de solidão
A se perder em meus traços...

Inversos.

Teus olhos rasgados,
As minhas asas em trapos,
O palavrear dos incêndios
A nos abarcar em chamas.

Os passos.

Essa urgência
Que nos incinera
Por dentro,
E aos poucos.

Tua voz.

Teu jeito de sorrir
Que me faz acreditar
Ser talvez passageira
A melancolia oriental
Dessas saudades assim,
De súbito e táteis
E quase-tão-exatas.

Espaço, milímetros.

Vício em poesia,
O café elétrico
Das tardes
Que se lhe escrevem
Bem aqui ao meu lado...

Tuas costas.

A câmera desfoque,
Os gestos trêmulos
Das línguas que se descrevem
Para além das palavras.

Silêncio, o teu.

A face oblíqua da noite
A escorrer em teus cabelos.
O desdobrar desse roteiro
Que descubro e reinvento
Por detrás de meus óculos.

Paraíso, o meu.

No sutil momento
Em que por acaso
Você lê,
Nos meus lábios
O contorno dos teus.